segunda-feira, 22 de outubro de 2012

PANORAMA TRICOLOR !

Pois bem, ódio e irresponsabilidade transformaram este jogo entre Fluminense e Atlético Mineiro em uma batalha de vida ou morte, literalmente falando. E numa das tardes mais emocionantes do ano, o ódio prevaleceu nas arquibancadas do Independência, felizmente longe das cores dos nossos admiráveis maníacos que lá estiveram.
Perigoso imaginar o que uma imprensa torpe pode levar aos corações de uma torcida. A do Atlético sempre foi reconhecida como uma das mais vibrantes do país, mas, domingo passado, prestou-se a papeis que transitaram entre o cômico e o ridículo. Os gritos incessantes de “vergonha” por conta da falta cometida por Leo na barreira tricolor, antes da bola de Ronaidinho chegar ao gol de Cavalieri, foram trucidados pelo próprio zagueiro no intervalo da partida, admitindo o que milhões de pessoas viram na tela: a infração simplesmente aconteceu. Antes disso, o ódio já estava estimulado no mosaico que fizeram com nossas cores, acusando o tricolor de ser o time “oficial” da CBF. A ideia pode ter sido boa para gerar repercussão visual, mas do ponto de vista da história é de uma ignorância raras vezes vista num estádio de futebol. No final, os atleticanos nas arquibancadas celebraram um título que, hoje, nenhuma tabuada permite ver, exceto os que ficaram pensando em 1971 como uma obsessão catalânica jamais repetida, tudo com narizes de palhaços, impropérios e demais quinquilharias da alma.
Até aqui, falei da mediocridade. Da estupidez provocada por irresponsáveis que têm o poder da comunicação. É hora de falar das coisas do jogo. O Atlético foi melhor, foi muito melhor nos primeiros quarenta e cinco minutos, ainda que tivesse para si a generosidade do árbitro, incapaz de marcar qualquer falta a favor do Fluminense – o que explica a enorme diferença do número de infrações entre os times na primeira etapa. Atacou o tempo inteiro, jogou como time grande, acertou duas bolas na trave, teve várias oportunidades – todas impedidas por mais uma grande atuação de Cavalieri – pelo menos três defesas espetaculares, colossais! -, mas a garra de Gum e Digão – este, mais afetado pelos inúmeros ataques alvinegros pela direita. Poderiam tranquilamente ter feito dois ou três gols. Mas não aconteceu. Bola na trave não altera o placar. Com sorte, poderia ter sido até melhor, vide o ataque de Nem já perto do fim, quando passou por Victor, mas não finalizou a tempo.
Sentimos muito a ausência de Jean, Deco não esteve em seus melhores dias – embora muito combativo – e Neves errou passes a granel. Bruno escorregou numa bola da esquerda que poderia ter sido crucial. Carlinhos, todos sabemos, é jogador de alta categoria, mas precisa sintonizá-la com a força física aplicada em campo. Edinho brigou muito.
Não seria meu caso o de apontar Diguinho como o culpado pelas constantes infiltrações atleticanas pelo meio, mas o meia está visivelmente sem a força de outras temporadas, sem contar as eternas faltas cometidas perto da área. Porém, se não fosse escalado, quem Abel colocaria, dada a ausência de Velencia? Percebam, falo apenas de um momento que pode ter sido de um tempo ou três partidas. Não fizemos jornadas espetaculares contra Ponte e Grêmio, mas a força do time do Fluminense nos permitiu quatro pontos. À beira do campo, o gestual e a gritaria de Abel indicavam que o excessivo recuo do nosso time não eram determinações suas, por mais que o Fluminense tenha adotado o procedimento de atrair adversários para seu campo e dar o bote no contra-ataque. Diante da enorme pressão, ter saído com o empate foi um bom negócio – Bernard e Ronaldinho foram monstros em campo. Além do mais, quem precisava correr era o Atlético, nove pontos atrás do líder. Quando voltamos, algo dizia que a velha máxima do futebol poderia germinar: quem não faz, leva. Dito e feito: em sua primeira jogada realmente agressiva da partida, o Fluminense marcou aos 10 minutos com Nem, passe preciso de Fred depois de receber de Bruno. Jogada açucarada, bola rasteira no canto esquerdo, vibração dos maníacos.
Mas não era o suficiente para bater o Galo em seus domínios. Veio mais uma bola na trave esquerda de Cavalieri e, depois, o empate com uma bomba no ângulo esquerdo. Belo passe de Ronaldinho, finalização de Jô. E tome ataques do Atlético. E tome a virada, novamente com Jô, em cima de Digão – em sua única falha -, depois de lindo cruzamento de Bernard, bola no contrapé, canto direito, sem defesa para Cavalieri. Tudo em catorze minutos, entre os 23 e os 37. Abel tirou os cansados Deco e Neves para as vindas de Wagner e Sobis, sem maiores vanguardas táticas; depois, na pressão Edinho – sempre lutador – saiu para a entrada de Samuel. O segundo gol de Jô poderia ter sido um golpe final, mas o Fluminense tem a vocação da luta até o fim, até o último grão da ampulheta e, a cinco minutos do fim, Fred mostrou porque é um grande artilheiro: recebeu bom cruzamento rasteiro de Carlinhos que resvalou na defesa e, num toque rápido e preciso, fez seu centésimo gol com nossa caminha, decretando o empate que, se bem administrado, seria mais um grande passo rumo ao sonho do tetracampeonato. Só que o Atlético não arrefeceu: manteve suas forças intactas, continuou a plenos pulmões no ataque, não sentiu falta de sua silenciosa torcida e, mesmo antes de marcar o 3 x 2 definitivo com Leo Silva de cabeça, já aos 47 minutos, após cruzamento esplêndido de Ronaldinho em diagonal, poderia ter marcado com Jô pouco tempo antes, na mesma posição.
A derrota sempre dói. Jamais será fácil. Mas é preciso entender os códigos, os significados disso por ora. O fato é que perdemos quando isso era possível.  Temos seis pontos de vantagem, duas vitórias a mais e três gols a mais no saldo. Como não acreditar no time que tem vinte vitórias? Enfrentaremos o Coritiba em casa na próxima quinta e, conseguindo três pontos, ampliamos a diferença para nove; o Atlético jogará somente semana que vem, contra o Flamengo no Independência  e, com o rubro-negro precisando pontuar para afastar de vez sua luta contra o rebaixamento, as facilitações vergonhosas – essas sim! – de 1996 e 1997 não poderão entrar em campo. Logo depois, o próprio Atlético visita o Coritiba, enquanto teremos uma difícil missão no Morumbi contra o São Paulo. Vencer na quinta é imperativo e traz o mar da tranquilidade de volta. Basta ver a classificação e os jogos com sobriedade. Não, nada está vencido e ontem aprendemos uma importante lição contra o oba-oba. Sim, o Fluminense continua como favorito ao título por tudo o que fez até aqui – mesmo nesta derrota para o Atlético, mostrou-se valente, guerreiro, lutador bravio e incansável, num espírito de comprometimento que só os campeões oferecem. Perdemos para um grande time que fez uma excelente partida, ora! Poderíamos tê-los vencido no Engenhão, não fosse a monumental trapalhada da arbitragem contra o gol de Fred – hipocritamente esquecido pelos tenores da vergonha. Não confundamos um ponto com uma reta inteira: o Atlético foi melhor neste domingo e mereceu sua grande vitória. O Fluminense é o melhor do campeonato e merece a liderança.
Para um desavisado que se depare com as manchetes de hoje e amanhã, o Fluminense se transformou no décimo-lugar da competição (atenção: isso é apenas uma discreta piada, quase tão sem-graça quanto as mesmas manchetes sugeridas).
A vergonha está na mentira dos jornais, na incitação ao ódio e à violência que tanto predominaram nos últimos dias recentes. O plano deu certo temporariamente: “O Fluminense não será campeão”, “A distância caiu perigosamente”, “O Galo ruma para o título” e outras baixarias. Ao tricolor, concedemos nosso amor aéreo – e ele flana entre as nuvens.
Neste domingo, dentro de campo, o futebol venceu com uma partida digna entre dois times que disputam o título vigorosamente; fora das quatro linhas, a massa equivocada repetia em gritos o fel que lhe foi oferecido dias a fio. A verdade indica a queda do Fluminense para o primeiro lugar do brasileiro, com toda a ironia devida. O resumo é de cada um.

Paulo-Roberto Andel

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Propaganda